Altar


Cresci em uma família onde a fé é a ancora de tudo.

Do lado materno conheci a umbanda, o espiritismo e uma força que nem sempre é visível aos olhos humanos.

Por diversas vezes consegui enxergar através desse véu fino que nos separa do mundo de lá. Cresci rodeada de presenças, nem sempre visíveis à todos.

Do lado paterno, aproximei-me do catolicismo. Estudei em um colégio de freiras em São Paulo.

A curiosidade e o medo da religiosidade sempre acompanharam-me. Cada tentativa de aprofundamento, sentia uma força extremamente próxima a mim e rapidamente comprimia-
me.
“Essa menina é médium, carrega a benção da cura!”

Que pesado para uma criança!

As expectativas externas acabaram por conduzir-me até o meu próprio altar.

Um copo que toda a noite completo com água na certeza que receberei o “medicamento” necessário para o próximo dia. Pau Santo, uma madeira especial que ao ser queimada exala uma fumaça que limpa as energias do ambiente, é extremamente agradável o seu cheiro. Há também os cristais, cada um com uma propriedade e cor. Floral, tenho sempre uma essência por perto, é uma forma sútil de tratar a alma. Uma pequena imagem de São Francisco Xavier, um santo católico que fez morada em mim. Oráculo da Iluminação, todas as semanas tiro uma cartinha, a desta semana é a Essência da Música (música é vibração e tudo vibra. Cada um de nós traz uma música original, que se juntará a grande sinfonia universal). Imagem de uma mulher, ganhei de uma amiga artista e por alguns motivos identifico-me com ela (ou elas). Minha guia (pendurada na luminária), devo a ter ganhado ainda muito pequena, ela é formada de contas cor de rosa e foi abençoada dentro de algum terreiro que minha família frequentava.  Figa de madeira, ganhei de um senhor que disse “é pra te proteger, fia!”. Japamala, uma espécie de terço indiano, ganhei de uma amiga que esteve em Rishikeshi para participar do evento de um professor que admiro muito. Arruda, descobri um pezinho desta planta quando minha roupa desprendeu-se do varal e caiu em cima dela, que presente!

Cada um dos itens carrega uma história e faz-me reviver algum sentimento (bom), não é à toa que eles fizeram morada aqui tão pertinho de mim, enquanto durmo! 
Enquanto rezo!

                                                         * Produzido durante a Jornada da Escrita Afetuosa *

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